O jovem vocacionado à vida militar conhece os riscos de seguir o sonho de servir à Força e à Nação. O que fazer ao ser excluído das Forças Armadas devido a lesões.
Porém, estar lesionado pode levar o jovem militar a passar por uma das maiores de suas frustrações: ser arbitrariamente excluído da Força sem nenhuma explicação.
Pois, ser visto pela Força ou por colegas como alguém descartável do dia para noite, talvez doa mais do que as próprias lesões resultantes do bom servir.
São inúmeros os casos de rapazes que estavam no Serviço Militar Obrigatório, e se lesionaram na coluna, joelhos, tornozelos, ombros, nas mãos, em acidentes, treinamentos e exercícios militares durante o período de instrução básica.
Porém, variadas são as formas para defender seus direitos no caso de lesão. Vamos lá!
- O que é ser excluído das Forças Armadas?
- Lesões podem levar à exclusão do militar das Forças Armadas?
- Quais as arbitrariedades da administração militar na exclusão de militares lesionados?
- Por que a colocação de militar lesionado na condição de encostado não não é uma medida adequada?
- Como comprovar que teve a incapacidade classificada de forma incorreta na inspeção de saúde?
1. O que é ser excluído das Forças Armadas?
A exclusão é o ato realizado pela administração militar que leva ao total desligamento do militar da organização a que estava vinculado para o serviço ativo.
O artigo 94 da Lei Nº 6.880, De 9 De Dezembro De 1980, Estatuto dos Militares, dispõe de vários casos que podem levar à exclusão do militar das Forças Armadas. Como exemplo, podemos citar os casos de: reforma, licença, desincorporação, transferência para reserva remunerada, extravio, dentre muitos outros.
Como consequência direta da exclusão, o militar em regra é encaminhado para a reserva. Todavia, em alguns casos, como o caso do extravio, a consequência será outra a ser determinada em lei.
O ato de desligamento será publicado em Diário Oficial, em Boletim ou em Ordem de Serviço da organização militar correspondente, e não poderá exceder o prazo de 45 do ato oficial (art. 95, § 1º, Lei 6.880/80).
No caso de ser um militar muito aplicado e que, assim não queira se desvencilhar do serviço militar passado o prazo acima, a má notícia é que esse período não contará como tempo de serviço.
Além dos casos trazidos, a exclusão também poderá ocorrer por decisão ex officio. Ou seja, decidida de acordo com o interesse unilateral da Força.
O artigo 125 do Estatuto dos Militares traz casos em que as praças poderão ser excluídas de ofício.
Para isso será necessário a pronúncia do Conselho Permanente de Justiça (em tempo de paz), Tribunal Especial (em tempo de guerra) ou Tribunal Civil (quando condenadas), nos casos:
I – praças condenadas, em sentença transitada em julgado, à pena restritiva de liberdade individual superior a 2 (dois) anos ou, nos crimes previstos na legislação especial concernente à segurança do Estado, a pena de qualquer duração
II – por haverem perdido a nacionalidade brasileira; e
III – que incidirem nos casos que motivarem o julgamento pelo Conselho de Disciplina previsto no artigo 49 e nele forem considerados culpados.
Nas palavras do doutrinador Jorge Luiz Nogueira de Abreu:
Exclusão a bem da disciplina é o ato de exclusão do serviço ativo das Forças Armadas aplicado, exclusivamente, ao guarda-marinha, ao aspirante a oficial e às praças com estabilidade assegurada. Compete aos Comandantes de cada Força ou autoridades às quais tenha sido delegada competência, efetivar o ato de exclusão a bem da disciplina. (ABREU, 2010, p.492)
Logo, como pode ser observado, a exclusão demarca justamente a data limite para contagem do prazo no serviço ativo, pois dá causa ao desligamento do militar (Art. 142, Lei 6.880/80).
Entendido o que constitui a exclusão?
Agora vamos para a classificação das lesões no serviço militar e os limites para exclusão do militar.
2. Lesões podem levar à exclusão do militar incorporado das Forças Armadas?
Para essa pergunta a resposta poderia ser simplesmente: sim!
Todavia, vamos ficar com a resposta: depende.
Mas por que isso? Porque para que haja a exclusão de um militar não basta a ocorrência de alguma lesão, mas sim o respeito aos procedimentos legais, a inspeções de saúde realizadas corretamente. Como também, a uma classificação correta do que levou à exclusão do militar.
Variadas formas de lesões podem levar à exclusão do militar porque levariam a casos de incapacidade ou invalidez.
Por incapacidade, tem-se lesões que podem debilitar a saúde do militar para exercer atividades unicamente militares. Já no caso da invalidez, tem-se a inviabilidade para o exercício de qualquer atividade laboral.
Caso ainda não conheça as hipóteses de incapacidade e de invalidez, temos um texto que trata especialmente sobre tais temas. Caso prefira vídeo, temos um especial para você, é só clicar:
Assim, a depender do tipo de lesão, do seu posto, do período e como a lesão foi adquirida tem-se a alteração da forma de exclusão do militar.
Com base nos aspectos acima, a exclusão pode resultar geralmente em: reforma, reserva remunerada ou licenciamento. O que Abreu (2010) define como:
A praça que, ao término do tempo de serviço, se encontrar baixada em enfermaria ou hospital, será submetida à inspeção de saúde para fins de licenciamento ex officio, se não for o caso de reforma. Mesmo depois de licenciada, desincorporada, desligada ou reformada, continuará em tratamento, até a alta hospitalar, por restabelecimento ou a pedido. (ABREU, 2010, p.197)
Como também, no caso de lesão, o militar poderá ser excluído por desincorporação nos seguintes casos:
- moléstia em consequência da qual o incorporador venha a faltar ao serviço durante 90 (noventa) dias, consecutivos ou não, hipótese em que será excluído do serviço ativo;
- moléstia ou acidente que torne o incorporado definitivamente incapaz para o serviço militar.
Tem-se casos também de exclusão motivada pela anulação da incorporação. O que ocorre quando há alguma irregularidade na concessão do vínculo do militar com a instituição castrense.
A anulação da incorporação e a consequente exclusão do militar pode ocorrer, por exemplo, no caso de lesão preexistente. Caso que, não deveria ter sido incorporado à Força.
Todavia, o cerne das discussões ocorre justamente porque, em muitos casos, ocorrem irregularidades e inconstâncias nas inspeções de saúde do militar e na classificação de suas lesões.
Com isso, tem-se muitas exclusões indevidas. Vamos problematizar o assunto um pouco mais? Vem comigo!
3. Quais as arbitrariedades da administração militar na exclusão de militares lesionados?
Quando o militar apresenta lesões que possam gerar alguma incapacidade para o serviço militar, são abertas Sindicâncias Administrativas.
Por meio do procedimento das sindicâncias, a administração militar apura como a lesão foi sofrida, suas proporções, dentre outros.
Ocorre que, em alguns casos, o devido procedimento não é realizado, seja na abertura da sindicância, seja no decorrer de seus passos quando instauradas. Visto que, dificilmente há orientação jurídica disponível.
Em consequência dessas fragilidades procedimentais, surgem muitas decisões com resultado como este abaixo.
IV. PARTE CONCLUSIVA
Em face do exposto que dos autos consta e cnforme análise na parte expositiva, o problema de saúde do Sd XXXXXXX, da Cia C Ap, pré-existia a data de seu ingresso no serviço do Exército, o qual foi incorporado, a fim de prestar o Serviço Militar Inicial, a contar de 1 de março de 2019, e que a incapacidade “B2” o impossibilita de prosseguir no serviço ativo, devendo ter sua incorporação anulada, baseado na alínea “a” do Art. 31.
Como pode ser extraído da decisão, o militar teve a sua INCORPORAÇÃO ANULADA sob a justificativa de que o problema de saúde é pré-existente.
Todavia, sabe-se que os militares passam por exames médicos rigorosos para poderem adentrar na Força. Exames esses que são solicitados por médicos do próprio Exército, Marinha ou Aeronáutica.
Dessa forma, são infundadas decisões da administração que apenas alegam que a lesão/incapacidade seriam anteriores ao ingresso no serviço do Exército. E que, assim, seriam excluídos com a anulação de sua incorporação.
Sobre as possibilidades de reavaliação dos benefícios, temos um texto especial para você:
4. Por que a colocação de militar lesionado na condição de encostado não é uma medida adequada?
Ser posto como encostado traz questionamentos a uma grande gama de militares. Especialmente, acerca de quais são os seus direitos.
Sanaremos também essa dúvida.
O encostamento é um medida que continua possível mesmo nos casos de desincorporação e de anulação da incorporação do militar.
Acontece quando o militar não está mais no serviço ativo e continua apenas a receber o direito à assistência médica.
Ser encostado significa, assim, o não recebimento de remuneração para o militar. Além disso, apresenta-se como uma maneira bastante criticada de oferecer um tratamento médico parcial, e muitas vezes ruim para aqueles que não fazem parte mais da Força.
O que acomete especialmente os militares temporários, já que os militares de carreira serão agregados à Força.
Todavia, após o tratamento o militar será tão logo desencostado.
Para reverter essa situação, os tribunais vêm trazendo decisões com maiores proteções aos militares encostados. O que traz uma luz às dúvidas dos militares encostados: tem-se um caminho possível para proteger seus direitos.
Logo, o mais recomendado para ampliar seus direitos, é que o militar entre com uma ação judicial e requeira:
- O recebimento do soldo;
- O direito de continuar agregado à Força;
- Além do mero tratamento médico.
Os tribunais vêm entendendo que o tratamento médico deve ir além do fornecimento de tratamento médico, pois deve auxiliar o militar até que este se estabilize para o trabalho.
Assim, enquanto está em tratamento, o militar faz jus a remuneração essencial para sua recuperação.
Decisão nesse sentido pode ser observada em apelação impetrada pela União ao PROCESSO Nº: 0802764-67.2014.4.05.8500, que foi julgada no TRF5. Razão em que, o tribunal deu decisão favorável ao militar.
O art. 108. do Estatuto dos Militares, inciso IV, prevê ainda o cabimento aos militares mesmo que a incapacidade não tenha relação direta com o serviço. Como decide também o Superior Tribunal de Justiça:
DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. MILITAR TEMPORÁRIO. INCAPACIDADE DEFINITIVA PARA O SERVIÇO MILITAR. REFORMA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. “A jurisprudência desta Corte tem entendido que deve ser concedida a reforma ao militar, ainda que temporário, quando restar demonstrada a sua incapacidade para o serviço castrense, sendo prescindível a demonstração do nexo de causalidade entre a moléstia sofrida e a prestação do serviço militar” (AgRg no Ag 1.025.285/MS, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Quinta Turma, DJe 21/9/09). 2. Recurso especial conhecido e provido.
Posto que, as lesões e as dores decorrentes das lesões muitas vezes podem impedir o militar de voltar até mesmo para o trabalho na vida civil.
Especialmente, no caso dos jovens agregados, não se apresenta razoável ser excluído da Força para ser sustentado pelos pais. Logo, apenas o tratamento médico não é suficiente.
Ademais, para buscar seus direitos, além da Ação Judicial, é importante possuir toda a documentação médica que comprove a sua situação de saúde, e que servirá de fundamento/base para os pedidos na ação.
5. Como comprovar que teve a incapacidade classificada de forma incorreta na inspeção médica?
Não é difícil imaginar a possibilidade de ocorrer alguma incorreção na classificação de saúde devido ao grau de minúcias analisadas pela administração.
Supondo que a sua Ata de Inspeção de Saúde venha com resultado “B1” ou “B2” quando na verdade deveria ter sido “C”, visto que você não consegue mais desempenhar atividades cotidianas e muito menos trabalhar normalmente, faz-se necessário que você procure um advogado militar a fim REVERTER essa decisão administrativa.
Veja um vídeo exclusivo sobre inspeção médica.
É muito importante que nesses casos o militar reúna a maior documentação possível (laudos, exames, receitas, atas de inspeção de saúde, tudo o que for possível obter), INCLUSIVE DE MÉDICO CIVIS a fim de comprovar a sua total inaptidão para o trabalho.
Conclusão
Chegamos ao fim desse texto. Conseguiu compreender quais são seus direitos nesse caso?
Com esse conteúdo você tomou conhecimento sobre a gama de direitos que possui enquanto militar lesionado.
Em primeiro lugar, possui o direito legal de tratamento médico adequado, até que esteja recuperado. E além desse, pode requerer ao judiciário: 1) que sua remuneração seja mantida e 2) que seja agregado à Força.
Ademais, sabe ainda que não precisa se contentar com inspeções de saúde que sabe conter algum vício. Como também, ser posto na condição de encostado pode não ser a medida adequada.
Frente a irregularidades nesses casos, busque as medidas judiciais cabíveis. Não permaneça à deriva com decisões administrativas que podem ser recorridas.
Tem-se uma expressão no Direito que pode ser o seu caso: o direito não socorre aos que dormem.
Então, lembre-se de guardar e de providenciar todas as suas documentações médicas e buscar seus direitos.
Se você continuou com alguma dúvida, ou precisa conversar comigo sobre seu caso e história.
Me manda um email (contato@vlucio.adv.br) ou uma mensagem pelo Whatsapp.
Será uma honra conversar com você.
Abraços militares,
Vinicius Lúcio
Advogado Militar, Professor de Direito e Mestre em Direito Constitucional (UFRN)
Ianna Cunha
Estagiária de Direito no VL Advogados
Referências
ABREU, Jorge Luiz Nogueira. Direito Administrativo Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2010.
BRASIL, Lei Nº 6.880, De 9 De Dezembro De 1980, Estatuto dos Militares, art. 50. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6880.htm>. Acesso em: 20 jan. 2022.
BRASIL, DECRETO Nº 57.654, DE 20 DE JANEIRO DE 1966. Regulamenta o serviço militar. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d57654.htm >. Acesso em: 26 fev. 2022.